Ao contrário de países desenvolvidos, o Brasil não costuma analisar os impactos de novas normas, sendo essa análise especialmente importante sob dois aspectos: custos de implementação e benefícios para a sociedade. A proposta de redução da jornada de trabalho é mais um exemplo.
É inegável que a redução da jornada de trabalho pode trazer mais qualidade de vida para o trabalhador, à medida que disponibilizará tempo extra para outras atividades, como lazer, dedicação à família, entre outros. No entanto, para que essa alteração seja viável, há uma série de etapas a serem superadas. Países mais avançados, como a Alemanha, já têm uma jornada de trabalho menor, mas possuem uma elevada produtividade. Mesmo com uma jornada reduzida e com um dos salários mais altos da Europa, a Alemanha, com cerca de 1/3 da população brasileira, foi a 3ª economia do mundo em 2023, atrás apenas dos EUA e da China. O PIB da Alemanha foi mais que o dobro do PIB brasileiro no mesmo ano.
No Brasil, o trabalhador gasta 1 hora para produzir o que um americano produz em 15 minutos. A produtividade é influenciada principalmente pela educação, pela infraestrutura e pela tecnologia. No campo da educação, o Brasil está estagnado no PISA, principal exame internacional que avalia conhecimentos em matemática, leitura e ciências, com resultados bem abaixo da média dos outros países. As escolas continuam despejando no mercado de trabalho uma infinidade de pessoas com dificuldades em realizar cálculos básicos de matemática e interpretar textos.
O acesso à tecnologia no Brasil ainda é muito oneroso quando se avalia o custo de aquisição e o poder de compra em comparação com os países desenvolvidos. Um europeu ou americano paga menos que um brasileiro para ter acesso à tecnologia. Nossa infraestrutura é cheia de gargalos, o que faz o frete de um produto produzido no Sul e comercializado no Nordeste ser mais caro do que um produto que chega ao porto de Santos vindo da China.
Nesse cenário, até mesmo as grandes empresas terão dificuldades em incorporar uma escala de 4×3, que prevê uma redução de 27% na jornada de trabalho. Os principais parceiros comerciais do Brasil, EUA e China, possuem jornadas de trabalho maiores do que a proposta, de modo que, se aprovada, o Brasil perderia competitividade no mercado internacional.
Quando se olha para os pequenos negócios, que respondem por 60% dos empregos formais, a situação é ainda pior. As pequenas empresas não têm margem para absorver o aumento de custos decorrente da redução da jornada de trabalho. Resta, então, repassar os custos para o consumidor ou reduzir o horário de funcionamento do empreendimento, com demissão de trabalhadores para compensar a perda de faturamento. Essa alternativa poderá inviabilizar os pequenos negócios, dando mais poder de concentração às grandes empresas, que têm mais flexibilidade para definir preços.
Além disso, não se vislumbra geração de empregos em função da redução da jornada. Ao contrário, já há uma série de vagas abertas no mercado de trabalho que não são preenchidas pela ausência de pessoas qualificadas.
Nesse contexto, a Rede de Associações Comerciais avalia que este não é o momento para a redução da jornada de trabalho. Devemos debater meios de aprimorar a educação e a formação profissional, além de melhorar a infraestrutura e o acesso à tecnologia, entre outros fatores que contribuem para o aumento da produtividade e do ambiente empreendedor. É hora de o Brasil discutir a reforma da folha de pagamentos para incentivar a contratação e retenção de talentos. Pular essas etapas apenas contribuirá para reduzir a competitividade das empresas brasileiras e, consequentemente, afetará negativamente o mercado de trabalho e a economia nacional.