Artigo publicado no Correio Braziliense
Por Alfredo Cotait Neto
Grande parte dos agentes econômicos brasileiros comemorou, no fim de 2023, a aprovação da proposta de emenda à Constituição que instituiu a Reforma Tributária no nosso país. Ainda com divergências, críticas e dúvidas, parecíamos estar diante de um consenso de que aquele passo era melhor do que nada. Assim, se fez um clima de otimismo (mesmo a versão aprovada não sendo a ideal). Entretanto, seis meses se passaram, com pouquíssimos avanços. A regulamentação da Reforma Tributária caminha a passos muito lentos, sem nenhuma perspectiva de que representantes do governo ou do Congresso estejam priorizando essa etapa tão importante. Afinal, a regulamentação é quando as novas regras realmente saem da teoria e partem para a prática. É quando os ciclos da economia e do empreendedorismo irão, realmente, sentir os impactos.
Esse momento de incerteza me faz recordar os antigos mágicos que se apresentavam na tevê, nas noites de domingo. Com recursos de luzes, tecidos e muita habilidade, enganavam a plateia diante de espetáculos de ilusão de ótica que deixavam muita gente intrigada até o dia seguinte. A versão televisiva tinha como objetivo gerar entretenimento. Mas a nossa versão econômica dessa ilusão de ótica não tem nada de prazerosa ou interessante. Pelo contrário: gera insegurança jurídica, apreensão, falta de investimentos e pausa nos negócios. O que é péssimo para o país.
A Rede de Associações Comerciais, por meio da Confederação das Associações Comerciais e Empresariais do Brasil (CACB), acompanha de perto as tratativas, negociações e conversas, porque considera que alguns pontos da reforma são inegociáveis. Defendemos a inclusão de parâmetros para garantir a não elevação da carga tributária global, o direito ao crédito nas aquisições realizadas de empresas e nas vendas realizadas por empresas optantes do Simples Nacional e a criação da cesta básica de alimentos com alíquota zero, além da garantia de que todos os alimentos que estão nas cestas básicas possam ter alíquota reduzida em 60%.
Desde abril, aguardamos que a regulamentação avance. A proximidade com o recesso parlamentar e com as eleições estaduais, no segundo semestre, tornam as previsões de avanço bem pessimistas. O texto precisa passar pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. Estamos diante de um calendário muito apertado, além da possibilidade de aparecerem urgências nacionais, como ocorreu com a catástrofe climática que se abateu sobre a população do Rio Grande do Sul. O possível otimismo do fim de 2023 desapareceu entre os agentes econômicos.
Há um outro problema que se tornou mais do que evidente: a falta de articulação política do governo no Congresso. O episódio que ocorreu no Senado, quando todos foram surpreendidos com a exclusão do tema da taxação de compras internacionais do texto do Mover, escancarou a falta de controle por parte da União. Líderes e presidentes das Casas não esconderam a surpresa. Os atritos se somam, no Planalto e no Congresso, tornando o clima político ainda mais conturbado.
Esse é apenas o último exemplo. O mais recente. Mas, em um ano e meio, são muitos os casos em que a falta de uma voz para construir diálogos em prol de soluções econômicas faz com que o cenário seja muito ruim para o futuro do Brasil. As disputas políticas precisam deixar temas econômicos de lado. E os representantes do governo precisam priorizar essas articulações para fazer com que a economia reaja, traga frutos e aumente a empregabilidade dos brasileiros. Em um contexto de desafios econômicos, sociais, de enfrentamento da desigualdade, é consenso na sociedade civil que é de emprego que o povo brasileiro precisa. E o emprego está nas mãos dos comerciantes, empresários e empreendedores que trabalham, diariamente, para gerar renda, pagar imposto e fazer a economia girar e crescer.
Ao cardápio das incertezas soma-se toda a insegurança jurídica na novela sobre a desoneração da folha de pagamento. E o fato de que, em pleno ano de 2024, inexiste uma discussão concreta sobre uma reforma administrativa, passo fundamental para realização de investimentos no país. Quisera eu que todo esse cenário de impasse fosse apenas uma ilusão de ótica.
ALFREDO COTAIT NETO
é presidente da CACB e da Facesp